domingo, 20 de maio de 2007

MONSENHOR VIEIRA NA HISTÓRIA DE PATOS

Por duas vezes esta semana falamos no nome do saudoso Mons. Manoel Vieira, nos nossos programas de rádio. A primeira vez foi no Factorama da segunda-feira, quando recordávamos aos torcedores nacionalinos, que a conquista do primeiro campeonato do clube, no domingo anterior, tinha uma história que remontava há quarenta e cinco anos atrás, quando o clube foi fundado. E entre as figuras maiores desta história estava o Mons. Vieira, a quem ninguém fizera referências nas comemorações do primeiro título estadual.

Na quarta-feira, voltei a falar no nome do Mons. Vieira, depois de ser surpreendido com a notícia de que uma estátua sua, existente em frente ao Colégio que leva seu nome, na Praça João Pessoa, ia ser transferida para um arremedo de praça construída no antigo monturo existente no lado esquerdo do mesmo Colégio. Da posição original, em frente ao Colégio que virara Estadual mercê dos seus esforços, e onde sua estátua parece vigiar quem entra e quem sai no estabelecimento a que dedicou quase trinta anos de sua vida, soubéramos que pretendiam escondê-lo num tradicional reduto de bêbados e maconheiros, escondido das vistas de quem passa pela praça. Só mesmo o desconhecimento do que Mons. Vieira representou para Patos poderia ditar tal mudança.

Mas esquecer ou desconhecer os que tudo fizeram por Patos, parece ser a sina de muitos que têm dirigido a cidade nos últimos tempos. Figuras como Ernani Sátyro, a maior expressão política de Patos, além de intelectual dos mais importantes, não seria lembrado pelos patoenses não fora a instituição de uma Fundação que guarda as suas memórias. A cidade não lhe dedicou sequer um beco.

A Padre Vieira o governo do Estado dedicou o marco maior de sua atividade na cidade de Patos, dando ao antigo Colégio Diocesano, transformado em Escola de 2º grau o seu nome. Mas não foi o Colégio Estadual a única obra a que Mons. Vieira se dedicou na cidade de Patos.

O Padre Manoel Vieira chegou a Patos no final da década de trinta para dirigir o Ginásio Diocesano, inaugurado pela Diocese de Cajazeiras em 1937 e que tivera no Padre Vicente Freitas o seu primeiro diretor. Padre Vieira tinha pouco mais de trinta anos quando aqui chegou, mas já trazia a experiência de dirigir o Ginásio Diocesano de Cajazeiras, berço da educação no interior da Paraíba.

No Ginásio Diocesano, Padre Vieira começou um trabalho hercúleo para a época de fazer de uma escola mantida pela Igreja naquela cidade pobre do semi-árido nordestino o mais importante estabelecimento de ensino do interior de Paraíba, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte. Para ali vinham os estudantes daqueles quatro estadosva que pretendiam ser alguma coisa na vida. Os que podiam pagavam pela educação e pelo internato, que mantinha dezenas de bolsistas, recrutados por Padre Vieira em toda a região, entre jovens que queriam progredir intelectualmente. Muitos dos quais iam se juntar a ex-seminaristas que ele acolhia para trabalhar como professores. Nos últimos setenta anos foram inúmeros os médicos, engenheiros, dentistas, bancários, professores, advogados, padres e políticos que passaram pelo tradicional estabelecimento da Praça João Pessoa. Ter estudado no Diocesano e depois Estadual de Patos era carta de apresentação para emprego em qualquer parte e garantia de sucesso em qualquer curso ou concurso em que se metessem. Alunos egressos do Colégio da Praça João Pessoa eram campeões nos vestibulares de João Pessoa, Recife e Fortaleza. Aqui estudaram governadores, deputados, desembargadores, além de honrados cidadãos que se orgulhavam de ter aprendido as lições escolares e de cidadania ministradas pelo Padre Vieira e as equipes, entre as melhores do Estado, que ele sempre formou ao seu redor.

Mas não foi moldar o Colégio Diocesano depois Colégio Estadual, a única grande obra de Mons. Vieira em Patos. Ele foi um baluarte na luta pela implantação da Diocese de Patos, aqui instalada em 1959. Ele se empenhou tanto pela implantação da Diocese que todo mundo pensa que iria virar o nosso primeiro bispo. Nomeado Dom Expedito, Padre Vieira virou vigário geral e continuou a secundar Dom Expedito na construção da diocese.

Logo em seguida ele se empenhou em outra grande obra. Trazer para Patos uma escola estadual para tornar acessível a educação secundária e colegial aos estudantes pobres que não podiam pagar no Diocesano ou no Cristo Rei, escola feminina fundada na mesma época. A demanda de estudantes pobres que queriam estudar era muito superior à capacidade das duas escolas diocesanas de conceder bolsas de estudos para os pobres, graças às sobras das mensalidades que os pais de melhores posses pagavam. Padre Vieira se aproveitou da amizade que tinha com lideranças udenistas como Pedro Gondim, Ernani Sátiro e Zé Cavalcanti e conseguiu que fosse criado o Ginásio Estadual de Patos. Na falta de um prédio para acolher a nova escola estadual, ele convenceu Dom Expedito a vender o prédio da Praça João Pessoa e construir um novo prédio para o Diocesano. Por isso, criado o Ginásio Estadual, o Diocesano continuou a funcionar ali até 1967, quando se mudou para o novo prédio construído no Belo Horizonte. Padre Vieira sofreu críticas por ter influído na venda do colégio, mas o tempo se encarregou de provar que ele tinha razão. Sob sua direção, o Estadual continuou a ser referência em todo o sertão. Mas o Estadual oferecia apenas o curso ginasial, enquanto o Diocesano oferecia primário, ginásio e científico. Padre Vieira só descansou quando o Estado criou o curso científico que passou a funcionar em 1963. Eu próprio fui dos últimos bolsistas do Diocesano e dos primeiros inscritos no Colégio Estadual.

Outra grande luta do Mons. Vieira foi a aquisição pela diocese de uma emissora de Rádio. Dom Expedito tinha grande prestígio junto aos seus colegas de episcopado e Mons. Vieira tinha os contatos locais e, em comum com Dom Expedito, a visão da importância de uma emissora de rádio para os trabalhos pastorais. Dom Expedito conseguiu com o Movimento de Educação de Bases, organizado pela Igreja, os recursos para a aquisição da Rádio Espinharas, que está aí, até hoje, prestando inestimáveis serviços a Patos. Dom Expedito, Mons. Vieira e Padre Milton Alencar formaram a primeira diretoria da Rádio Espinharas de Patos Ltda., depois convertida em Fundação Cultural Nossa Senhora da Guia.

Uma coisa que Padre Vieira sempre valorizou, enquanto educador foi o esporte. Para isso construiu um campo de futebol nos fundos do Diocesano, onde Botafogo de Inocêncio, Esporte, Fluminense e o próprio time do Ginásio enfrentavam os seus adversários. Atém 1965, o campo do Ginásio foi a nossa principal praça de Esportes.

Até 1961, o Esporte, fundado alguns anos antes para suceder o Botafogo de Inocêncio Oliveira, era o único representante da cidade. Um grupo de funcionários das repartições federais sediadas em Patos, como Correio, DNER, DNOCS e Rede Ferroviária, resolveram criar um time de futebol a que deram o nome de Nacional. Padre Vieira logo encampou a idéia. O clube, cujo time inicialmente era formado por empregados das repartições federais, passou a organizar um time mais competitivo para enfrentar o já tradicional Esporte de Patos. E aí foi importante o apoio do Mons. Vieira. No final de 1964, enquanto lutava junto a Federação Paraibana, juntamente com outros desportistas ardorosos, pela entrada de Esporte e Nacional do Campeonato Paraibano, Mons. Vieira tratou de fortalecer o Nacional. Nesta época, meio time do Nacional, trabalhavam no Colégio Estadual. Ribamar que já era professor, passou a ter a companhia de João Batista, Teixeirinha, Bastinho, Perequeté, Zé Canário, Petrônio e outros que se transformaram em inspetores de alunos. Passaram a ganhar do Estado, o salário que o time ainda não podia pagar. Um ou outro dos acima pode até não ter sido inspetor de alunos, mas foi tenho certeza aluno de uma turma noturna que Mons. Vieira criou só para adultos, turma da qual eu fui professor de Português. A luta de 1964, surtiu efeito e já em 1965, Nacional e Esporte participaram do seu primeiro campeonato paraibano. Cresceu aí, portanto, à sombra do Colégio Estadual, o campeão de 2007. Nascido nas repartições públicas federais, criado no Estadual. E dirigido, no primeiro, campeonato, por outro esquecido dos campeões de agora, Dr. Amaury Vicente.

O trabalho feito em Patos, o reconhecimento do Governador João Agripino, eleito em 1965, pelo trabalho eficiente de Mons. Vieira, fizeram dele o primeiro secretário de Educação de um dos maiores governadores que a Paraíba teve em sua história. Mas não demorou muito no cargo. Alguns meses depois foi convocado para uma missão tão importante quanto árdua. Substituir Ernani Sátiro como deputado federal da região, já que Ernani ameaçava pendurar as chuteiras. No fim, “os revolucionários de 1964” fizeram questão da presença de Ernani na Câmara e houve um certo estremecimento na UDN local. Mas, a campanha de Mons. Vieira estava nas ruas e Patos terminou elegendo os dois. Mons. Vieira cumpriu todo o seu mandato com eficiência trabalhando por toda a região que o ajudou a se eleger. Apesar de sacerdote católico conseguiu verbas até para o Centro Espírita da cidade. Filho de Uiraúna, a cidade que mais padres deu à Paraíba, Padre Vieira se fez antes de tudo filho de Patos. Por nossa cidade ele combateu todas as lutas do seu tempo, a ela dedicou todo o seu mandato de deputado federal. Infelizmente, problemas na visão o desestimularam a continuar na política e ele terminou a vida no exercício no múnus sacerdotal, como capelão de presídios na capital do Estado. Um acidente tirou-lhe a vida, alguns dias depois da eleição de Ronaldo Cunha Lima para governador.

Infelizmente, muita gente esquece ou procura fazer com que sejam esquecidos aqueles que tudo fizeram pela cidade. Enquanto procuram criar um culto para uma figura menor da nossa política, procuram empanar o brilho daqueles cujo brilhantismo ofusca a pequenez do novato. Não sei de quem foi a idéia de jerico (que me perdoem os jegues, tão malsinados nos últimos tempos) de tirar a estátua de Mons. Vieira de sua posição vigilante na frente da Escola que ele fez, para esconder num antigo monturo, tão freqüentado por bêbados, prostitutas e maconheiros. Que mandem para ali estátuas de figuras menores da nossa história. Se a estátua de Mons. Vieira incomoda no leito da rua, que a coloquem nas escadas da praça João Pessoa ou no espaço existente bem em frente ao Colégio, no platô da praça, onde não vai incomodar a ninguém. Afinal, a praça é do povo de Patos e poderia ter em cada canto uma homenagem a patoenses ilustres a quem não se prestou a homenagem merecida. E que venham para a praça outras figuras como Dom Fernando Gomes, Dom Expedito, Ernani Sátyro, Nabor Wanderley pai, Allyrio Wanderley, Otacílio Queiroz, Clóvis Sátyro, Darcílio Wanderley, Bivar Olinto, Romero Nóbrega, Zé Gaioso e tantos outros que contariam as coisas bonitas da história de Patos. E que reservem uma outra praça para as figuras folclóricas, Tranca-Ruas e Manduri à frente. Seria uma maneira de ensinar aos pósteros um pouco da história da cidade.

Neste ano de 2007 se comemoram os cem anos do nascimento de Mons. Manoel Vieira, nascido em 1907. Não será com atitudes mesquinhas como esta de desalojá-lo do pedestal de estátua que se homenageará quem tanto amou Patos e quem tanto fez por ela. Só o despeito de quem nada tem a apresentar de benefícios feitos a Patos poderia ditar atitude tão mesquinha. (LG)

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